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mãe millennial filho alpha

por que a educação do século XXI virou um choque de gerações — e como isso muda a sua maternidade

an abstract photo of a curved building with a blue sky in the background

ESTAMOS VIVENDO O MAIOR CHOQUE GERACIONAL DA HISTÓRIA DA PARENTALIDADE

Até hoje, pais e filhos nunca tinham recebido uma educação tão diferente em tão pouco tempo na história do mundo.

Se você nasceu entre 1981 e 1996, você é Millennial - como eu. Se nasceu depois de 1997, você é Gen Z, mamis. E os seus filhos? Eles são Geração Alpha (nascidos entre 2010–2024); ou Beta (os babies que estão chegando entre 2025–2039).

“E daí”? Você tá se perguntando.

Você com certeza sabe que cada geração tem as suas próprias características. Há mais de 100 anos que a Sociologia estuda esses recortes espaço-temporais de uma camada populacional, pra entender como o ambiente e o momento histórico se refletem na forma como esses grupos de pessoas encaram a vida. O contexto em que esses grupos vivem a primeira infância, a formação escolar, a entrada no mercado de trabalho, os primeiros relacionamentos afetivos e sexuais, a formação profissional, a chegada da época dos casamentos, quando têm filhos etc...todos esses atos e comportamentos humanos assumem determinados formatos conforme o tempo ao qual cada um de nós pertencemos. Karl Mannheim, William Strauss, Neil Howe e até uma parte da produção científica de Pierre Bourdieu emprestaram seus cérebros brilhantes pra ajudarem a gente a entender um pouco mais sobre as gerações. Mas tudo isso, como eu já disse, já é sabido.

Nós, Millennials e Z, fomos formados pela mesma educação tradicional dos nossos pais e avós (ou “bancária” – como diria Paulo Freire). Sentamos obedientemente em cadeiras enfileiradas numa sala de aula. Ouvimos dia após dia cada uma das exposições de nossos professores. Se ousássemos questionar algo, éramos rapidamente tolhidos e tidos por “chatos”. E ai da gente se tentasse trocar uma ideia com a galera no meio da aula! Éramos silenciados no mesmo instante e, se fosse um dia de azar, mandados pra sala da diretora sem dó nem piedade. Em casa, a coisa não era muito diferente.

As crianças tinham as suas obrigações muito bem definidas dentro da família. A gente devia obedecer aos adultos; JAMAIS questionar as ordens; atender imediatamente ao que nos fosse pedido; comer tudo rapidinho; dormir cedo; fazer a lição de casa com capricho. Nas poucas vezes em que eu tentei participar da conversa dos adultos durante o jantar, eu levei um “fica quieta; essa conversa não é pra você”. E me calava. Eu cresci assim, num contexto familiar que flutuava entre o autoritarismo ríspido paterno e um estilo autoritativo materno mais afetivo (mas numa casa sem violência física, graças a Deus)!

Estudei grande parte da vida em escola pública, mas era uma aluna dedicada. Passei numa boa faculdade pública. Fui fazer intercâmbio fora. Fiz outra faculdade e um mestrado. Adoro trabalhar como profissional – mas me divido entre a profissão e os cuidados domésticos. Me casei em 2017. Tive 1 filho único em 2018. Segui praticamente que à risca o fluxo dos Millennials – a não ser pelo fato de ter saído de casa e tido filho “cedo” pra minha geração: aos 30 anos. E aí que...a realidade do século XXI começou a me mandar uma conta meio desconfortável...

Quando eu me tornei mãe, percebi que a minha maternidade instintiva estava COMPLETAMENTE desencaixada da necessidade de educação-criação que a realidade do século XXI exigia de mim. A ciência da educação e do neurodesenvolvimento trouxeram novas ferramentas pra beneficiar a infância – e a esmagadora maioria das famílias não estavam conseguindo conhecer e muito menos acessar e usar essas ferramentas. O meu papel social maternal estava deslocado das demandas de futuro do meu filho e, pela primeira vez na história, a nossa geração - Millennials e Gen Z – foi inevitavelmente esmagada contra a parede no momento de exercermos nossos papéis sociais de mães e pais. A parentalidade pra qual fomos geracionalmente programados pra dar não é mais a parentalidade que o mundo nos pede. E eu precisava responder a isso – rápido.

Eu sei (e reconheço isso sem papas na língua e falsa modéstia) que sou privilegiada por ter percebido isso aos 2 minutos do primeiro tempo, graças à minha formação acadêmica em educação. Quando o meu filho tinha algumas semanas de vida, eu já fui atrás de organizar as produções científicas sobre neurodesenvolvimento da primeira infância. E aproveitei pra cruzar essas descobertas incríveis com a área da educação infantil a Base Nacional Comum Curricular brasileira...e, claro, com as teorias de criação. Aos poucos, eu fui entendendo que precisava dar “tchau” pro meu instinto de educar, pra recepcionar a consciência e intencionalidade de educar um filho. Mas, ao mesmo tempo em que eu entendi que meu “instinto materno” precisava sair do campo da educação, vi que ele não deveria ser jogado fora: ele poderia ser abraçado e acolhido no campo da criação. A parentalidade do século XXI PEDE URGENTEMENTE a revisão de alguns paradigmas educacionais.

O primeiro paradigma que precisa ser questionado é o de tratarmos a educação através da óptica bipartida escola-família: OU tenho um livro pra falar de educação escolar, OU tenho outro, separado, pra falar de parentalidade. OU leio e estudo sobre escola, OU eu escrevo e entendo sobre educação-criação em casa. As coisas mudaram; são fluidas; se misturam; o ser humano não aprende SÓ na escola OU SÓ em casa. Ele se forma, é formado e forma os lugares e as pessoas com os quais se depara e por onde passa. A educação é multifacetada: não é mais genética x determinismo ambiental; é genética + ambiente + combinações genético-ambientais. A ideia de educação no século XXI é ampla, aberta e sem fronteiras conceituais impositivas, assim como o é a globalização e o fluxo de pessoas e coisas ao redor do mundo hoje. O que eu quero dizer com isso? Não basta a escola puxar a sardinha pro lado do ensino e da aprendizagem de habilidades e competências desde a implementação da BNCC aqui no Brasil. Enquanto as famílias não entenderem e assimilarem - teórica e praticamente – a necessidade de adequarem suas criações EM CASA...as gerações Alpha e Beta não terão todo o desenvolvimento que poderiam ter. Não conhecerão toda a educação boa que poderiam acessar. Escola e família PRECISAM caminhar juntas pra mesma direção, pra criança não sentir nem viver grandes ruídos na sua construção de si.

Outro paradigma que merece refazimento é o de que instinto materno basta, ou pior: de que a presença materna basta pros primeiros anos de vida. Apesar da existência consolidada de teorias psicológicas de importância histórica sobre a infância (me refiro, por exemplo, às ideias de Winnicott), a ciência do neurodesenvolvimento já conseguiu mostrar quais são os componentes necessários e suficientes pra que uma criança viva uma infância saudável, potente e feliz. Uma infância que se faça terreno fértil não só pra construção de um adulto confiante e independente, mas de um adulto confiante e autônomo, claro, mas também autorrealizado e dotado das ferramentas de que vai precisar no futuro. Esses componentes são:

1. Adultos cuidadores responsivos (na creche, escola e em casa);

2. Ambiente acolhedor, afetivo e sem stress tóxico (na creche, escola e em casa);

3. Ensino de habilidades essenciais pra vida (estímulos certos pra cada estágio do desenvolvimento).

Talvez entre 1940 e 1960, a simples e poderosa “presença materna” pudesse bastar aos nossos avós e pais. Ali naquele contexto geracional, talvez bastasse ESTAR PERTO pra que uma mãe fosse considerada “suficientemente boa”. Mas voltando: acontece que as coisas mudaram. O mundo é outro: mais veloz, fluido, competitivo, transfronteiriço, de metadados. E a educação precisa mudar pra acompanhar essas novas configurações sociais, econômicas e culturais. Hoje, precisamos olhar pra parentalidade como algo que contempla, une, atravessa e associa pelo menos 3 esferas distintas: CUIDAR + CRIAR + EDUCAR. Elas são complementares hoje em dia. E estamos diante de um novo modelo de educação.

O QUE AS GERAÇÕES DOS NOSSOS FILHOS ESTÃO EXIGINDO DE NÓS COMO MÃES E PAIS? (E será que estamos conseguindo dar o que elas exigem?)

Vamos ver primeiro quais são as características das gerações dos nossos filhos? Dá uma olhada no quadro.

Já faz mais ou menos 2 décadas que a educação começou a mudar nas escolas de praticamente todos os países ocidentais. Aqui no Brasil, essas mudanças chegaram através da BNCC. Mas esse movimento de renovação e adaptação às demandas sociais e necessidades do mercado de trabalho levaram um tempo até começarem a chegar às famílias. Nos E.U.A. e na Europa, por exemplo, esse lance de neurodesenvolvimento e o cruzamento das descobertas da ciência com o campo da educação já são coisas que não representam exatamente uma novidade. Só que no Brasil, no entanto, as coisas andam meio devagar e são um tanto quanto diferentes. Por aqui, a nossa geração de mães e pais ainda se faz blasée ao que os dados científicos já comunicam aos gritos há 2 décadas. Quer 1 exemplo? Eu dou 2.

De acordo com uma pesquisa recente publicada pela Fundação MARIA CECILIA SOUTO VIDIGAL:

1. 42% dos brasileiros desconhecem ou não sabem o que significa o termo “primeira infância”

2. apenas 2% da população sabe identificar corretamente que essa fase vai de 0 a 6 anos de idade

3. 41% acham que o pico de desenvolvimento acontece depois dos 18 anos

4. 25% acham que é dos 12-17 anos

5. 84% não considera os anos iniciais como fundamentais para o desenvolvimento humano

E detalhe: esses números assustadores se referem ao conhecimento de um conceito. Só 2% da população sabe o que é exatamente a primeira infância. Mas você já pensou, dentro desse grupo mínimo, quantos ajudam efetivamente seus filhos a se desenvolverem? O SABER pro FAZER é um salto imenso. É o ínfimo do ínfimo do ínfimo de famílias que hoje estão conseguindo educar os seus filhos, preparando as novas gerações pro futuro do século XXI de daqui a 20 ou 30 anos. E eu não culpo as famílias que ainda não estão acompanhando o bonde, até porque essas mães e esses pais são das gerações Millennials e Z, que tiveram suas educações tradicionais e, consequentemente, acreditam que essa educação ainda vai bastar. De novo, voltamos ao papo geracional!

O CHOQUE DE GERAÇÕES DAS INFÂNCIAS

As diferenças educacionais entre a nossa geração e a de nossos filhos não param por aí. Muitas outras questões atravessam a nossa parentalidade, levando angústia e trazendo dúvidas pras nossas cabeças. Ser mãe no século XXI não tem sido uma tarefa nada fácil:

Na nossa cabeça e nos nossos corações, fica marcada aquela vontade saudosa de querer que os nossos filhos tenham a chance de viver pelo menos um tantico da infância solta que a gente viveu. Se a gente brincou na rua, agora damos tablets pros nossos filhos se distraírem no sofá. Se crescemos esperando, a gente corre pra entregar tudo imediatamente. Se ouvíamos "vai brincar lá fora", a gente precisa dizer "desliga isso". Se aprendemos com lousa e GIZ, eles aprendem com I.A. e Youtube Kids. Enquanto tínhamos poucas opções e prestávamos atenção, agora lutamos contra o excesso de brinquedos das crianças e a atenção fugaz. E essas infâncias tão distantes não representam só uma diferença de comportamento geracional. Essas diferenças vão significar arquiteturas cerebrais diferentes...de 1 geração inteira...de 2 gerações inteiras. E, mamis, eu não sei o quanto eu gosto disso...

O QUE AS FAMÍLIAS PRECISAM FAZER AGORA?

Será que nós, os Millennials e Z, precisamos dar tablets e um armário de brinquedos pros nossos filhos? Ou será que eles precisam do nosso tempo e da companhia rotineira de outras crianças? Será que eles precisam se distrair e ficarem entretidos pra não encherem o saco dos adultos da casa, ou precisam de um misto bem selecionado de brincadeiras dirigidas e livres?

FECHANDO...

Se você é mãe ou pai Millennial ou Gen Z, você não tá criando seu filho(a) no mesmo mundo em que você cresceu nem com a mesma educação que você recebeu. A nossa geração de pais tá tendo de se virar nos 30 pra se adapta e ofertar, pras gerações dos nossos filhos, a educação que não tivemos. E isso não é fácil. Mas também não é impossível...

Isso pode ser um belo convite pra um novo tipo de presença materna e paterna. A infância não precisa de mais apps. Precisa de vínculo, conversa, exercícios, brincadeiras potentes e uma rotina afetiva intencional.

Não existe educação do futuro sem pais conscientes no presente. E eu tenho certeza de que é melhor encarar a coisa de frente do que tentar empurrar a sujeita pra baixo do tapete, mamis.

Se você quiser começar a usar a ciência da educação pra ajudar seu filho(a) a se desenvolver de forma intencional, estagiada e atenta às necessidades e do século XXI, eu te convido a conhecer os Fichários de Desenvolvimento da Jabuti LêLê. São materiais estilo ebook que trazem um mapa prático da infância, marcos de desenvolvimento e dicas de brincadeiras e atividades simples pra fazer em casa e estimular o aprendizado de habilidades básicas pra cada idade.

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Com carinho,

Mari Bleker

(Mestra em Educação e Filosofia pela Faculdade de Educação da USP, graduada em Letras-Português pela Universidade Nove de Julho, formada em Direito pela USP e idealizadora da Jabuti LêLê)